Chegamos na escola no horário combinado e fomos orientados a aguardar a Diretora no refeitório. Enquanto aguardávamos pudemos observar as crianças chegando com seus responsáveis, muitas delas trazidas pelo que parecia ser pai e mãe. Algumas estavam uniformizadas e muitas não. Vinham caminhando, outras de colo e outras carregadas em carrinhos bem divertidos, com brinquedos dependurados que logo eram entregues aos pais que as levavam às respectivas salas e iam embora sem que houvesse choro de nenhuma das partes.
A Diretora apresentou-se como Tati e nos perguntou se sabíamos em que turma cada um faria sua observação. Como não sabíamos, perguntou se tudo bem ficarmos com os maternais e, logo nos encaminhou às salas. Como estamos em quatro residentes, ocupamos quatro das dez salas.
A sala a qual fui encaminhada tem vinte crianças entre três e quatro anos de idade que são acompanhadas por duas Professoras Formadoras chamadas Maria e Lúcia.
Entrei na sala e tentei, sem sucesso, buscar um lugar que me possibilitasse passar um tempo escondida, para poder observar a dinâmica neste primeiro momento. Fiquei colada à parede e mesmo assim quase todos me olhavam.
Foi impossível escapar de um olhar muito duro e de um questionamento muito direto: "Você veio me furar?" Esta fala veio da Cibele, uma das crianças sentadas na mesa mais próxima à porta. Diante da tentativa de intimidação, achei melhor me apresentar e dizer que não, eu não estava ali para furá-las. Disse meu nome e que assim como elas, também sou estudante. Estou ali observando como as aulas acontecem porque faz parte da minha formação. Assim como as crianças italianas que receberam Corsaro prontamente, elas também me acolheram. Em cinco minutos eu já estava fazendo desenhos, tentando memorizar os nomes (inclusive de pais, mães e irmãos) e aprendendo uma brincadeira nova.
O garoto que propôs a brincadeira, mais tarde entendi, que é uma criança que faz poucas proposições e que interage pouco com a professora.
Durante todos estes acontecimentos, apenas a professora Maria se encontrava na sala porque a professora Lúcia estava no café. Percebendo a aceitação das crianças para comigo e minha para com elas, ela também me aceitou. Tive essa percepção a partir do momento em que ela puxou a brincadeira, parecida com tudo o que seu mestre mandar, onde ela dizia o nome da criança e que ditaria as ordens. Imitamos gato, cachorro, pato, leão, entre outros. Quando nos cansamos da brincadeira, voltamos a conversar e elas manifestaram a vontade de desenhar, mas a professora Maria disse que teríamos que esperar a "hora do remédio" para decidirmos o que faríamos.
A professora Lúcia retornou e preparou uma dose de água com uma substancia, algo que me pareceu um acontecimento integrado à rotina da sala. As crianças interagem nesta hora, fazendo as vezes de um cronômetro para que a professora possa ingerir a substancia. A partir daí a aula começa. A professora coloca no quadro a representação numérica do dia enquanto a professora Maria entrega um calendário para cada criança É uma folha de sulfite com os dias do mês impressos nele. Cada criança possui o seu e cumpre a tarefa de colorir o dia representado no quadro. Infelizmente a ação não apresentou sentido para muitas das crianças, que acabaram fazendo porque copiaram de outras crianças.
Fomos ao refeitório onde serviram às crianças leite com chocolate e bolachas. As profissionais servem as canecas e as professoras levam até a mesa. Quando terminam, as crianças colocam as canecas vazias numa mesa de apoio e voltam à mesa, aguardando que as outras terminem.
Voltamos para a sala. A professora Lúcia lê os diários de comunicação com os pais e responde alguns enquanto a professora Maria chama as crianças para a hora da estória.
"Qual o sabor da Lua?" foi a escolhida. Este link http://www.caminhandocontando.com.br/2011/08/qual-o-sabor-da-lua.html leva à um blog que apresenta a estória e uma possibilidade de intervenção.
Após a contação, Cibele (aquela que perguntou se eu estava ali para furá-la) realizou um reconto com a ajuda da professora Maria. Particularmente senti falta de uma reflexão sobre a estória, de falar da cooperação entre os animais para alcançar o objetivo, ainda que habitualmente uns tirem a vida de outros.
Terminada a contação, a professora Lúcia preparava o que chamou de "chamada viva" (alguns cartões impressos com o nome das crianças que recortava e preparava para cobrir com contact) e solicitou à Professora Maria que buscasse a caixa de brinquedos. Eram duas caixas plástica, uma com carros e peças de montar, outra com panelas, pias, fornos, liquidificadores, etc). Meninas primeiro, meninos depois levantavam e pegavam o que queriam. Para um dos garotos (Diego, quem me foi apresentado como um potencial candidato a "menino problema", de acordo com a ideia das professoras), que acabou se desentendendo com Geovanna em razão de disputa por uma torrada de brinquedo, foi sugerido que trocasse os utensílios de cozinha por caminhões e peças de montar.
Foi oferecida água às crianças e retirada uma blusa das crianças que vestiam duas para que pudéssemos ir ao parque. As crianças brincam, prevalecendo o aspecto do cuidar, com a ausência de problematizações a respeito das proibições. Apenas, não e o porquê é porque não.
Voltamos direto para o refeitório para o horário do almoço . As crianças lavam as mãos muito rapidamente, se juntam numa mesa e aguardam as professoras levarem na mesa.
Fim do almoço e fomos direto para um outro parque localizado ao lado do estacionamento , juntamente com outras duas turmas.
Confesso que fiquei preocupada com o diálogo entre as professoras que discutiam sobre questões identitárias, tomando como referência a reportagem exibida no fantástico sobre um garoto assassinado. Nesta hora fui convidada ao diálogo porque elas não se lembravam dos termos usados na reportagem. Também não conheço sobre o tema, mas por ter assistido à reportagem, eu sabia que os termos usados foram cisgênero, binário e não-binário, com o qual a vítima se identificava. Senti certa hostilidade neste momento quando uma das professoras disse que elas não sabiam sobre estes conceitos porque elas não estudavam na UNIFESP, local onde circulam certas modernidades.
Muito nervosa, uma das professoras disse que com os filhos dela estes experimentos jamais aconteceriam, que quem estivesse aberto a estas ideias de que questões de gênero são questões construídas pelo homem, que as ensinasse aos próprios filhos. Entendi delas, que filhos são inclusive seus alunos e que a estes estas questões não seriam ensinadas.
Voltamos para a sala e "enrolamos" até o horário da saída. Entregues todas as crianças, fomos os quatro conversar com a coordenadora Alessandra, que nos pôs a par do projeto anual chamado de Cantando, brincando, fazendo e aprendendo" e do subprojeto do mês de maio, intitulado Brincadeiras e do projeto do mês de junho, que em função da copa chama-se Copartilhando. Perguntei sobre o alinhamento das ideias entre os profissionais da escola, uma vez que o projeto é desenvolvido pelas escola. A primeira impressão que tive é a de que algumas das formas de organização do trabalho não se cumprem, ou quando se cumprem, são apenas formalizações.
Estas foram algumas das percepções de um primeiro momento. Algumas delas espero que sejam falsas percepções.
Nanci
Nanci
Olá residente desconhecida - será que você é Nanci?
ResponderExcluirAssine as postagens. Eu vou tentar descobrir porque o seu nome não apareceu.
Gostei muito de seu registro.
Como as crianças chegam, com quem, o que vestem...
Como vocês foram recebidos/as...
Vocẽ pode ficar mais atenta ao momento da chegada na sala. Como é que as professoras recebem as crianças: o que é proposto, o que as crianças fazem, como, como é a orientação? Como são os humores? Os olhares?
Vocẽ descreve a presença de alguns artefatos bem escolares no dia a dia das crianças: a chamada viva, a agenda, o calendário. Eles vão sendo apresentados as crianças logo no primeiro momento do dia como mediadores dos aprendizados de nomes, de noções de tempo e da relação com a família. Vamos ver como é o trabalho com esses "artefatos".
Vocês tiveram acesso aos projetos, ou foi só uma conversa com a coordenadora?
Do que as crianças brincam quando estão no parque?
Quanto tempo as professoras conversam enquanto elas brincam?
As professoras em algum momento brincam com as crianças?
E sobre o refeitorio: vamos ver se nos próximos dias as crianças vão se servir ou se "esperar pela comida" já é uma prática estabelecida.
Você falou da caixa de brinquedos e disse quais brinquedos elas continham, mas não contou como as crianças fazem uso deles: carros e peças de montar, outra com panelas, pias, fornos, liquidificadores, etc. Como escolhem? Como brincam com tudo isso: brincam sozinhas, em grupo, em dupla? Elas trocam os brinquedos? Quanto tempo ficam nessa atividade?
Por que tem um garotinho que não pode escolher e já recebe brinquedos determinados?
Que pena que elas acham que na Unifesp a gente sabe de tudo, porque eu teria dificuldade de explicar os conceitos de cisgênero, binário e não-binário - só sei de ouvir falar e não vi a reportagem na TV.
Ah! O CD do MPB 4 é: ADVINHA O QUE É?
Todas as músicas são uma beleza. Amo de paixão!
Segue link.
Adivinha o que é - YouTube
Vídeo para adivinha o que é mpb4 download
▶ 2:21
https://www.youtube.com/watch?v=Tw80p1ZCElo
12 de fev de 2013 - Vídeo enviado por Carolina Barioni
Música de Renato Rocha, por MPB-4. Disco de 1981 - Adivinha o que é.